Mas... Havia outras ideias!
Breno Botelho de Vasconcelos, açoriano, natural do concelho de Ponta Delgada, ilha de S. Miguel, era o alferes miliciano que comandava o 3º pelotão da Companhia de Caçadores 2505. Figura franzina, oficial de trato afável e educado, tinha alguma dificuldade em deslocar-se nas operações com incursão nas matas dos Dembos, norte de Angola. Era ajudado algumas vezes, pelos soldados do seu pelotão, no transporte da mochila e algum material.
Foto
do 1º cabo Arlindo Carlos de uma operação nos Dembos (o que sobrava dum acampamento inimigo abandonado)
O Alferes Miliciano Breno Botelho de Vasconcelos, sentado de óculos
O Alferes Miliciano Breno Botelho de Vasconcelos, sentado de óculos
Depois
de passadas as dificuldades do Dange, com o regresso a Luanda pelo Natal, à
nossa companhia foi confiada, entre outras missões (patrulhamento dos bairros periféricos de Luanda, escolta ao
comboio de Luanda/Catete, escolta a colunas MVL para o norte de Angola), a
guarda à "rede de Luanda". A guarda à "rede de Luanda" constava
de cerca de 50 postos de vigia, começava junto ao mar a nascente e
prolongava-se até à outra ponta do mar a poente, numa extensão de cerca de 15
KM, nos limites da cidade (cercada por arame farpado em todo o círculo). Ao
longo da rede existia uma "picada", que era percorrida pelas
patrulhas de ronda que zelavam pelo bom funcionamento da vigilância. Essas
patrulhas eram compostas pelo condutor da viatura e por um graduado
(normalmente um furriel ou um alferes). Havia, salvo erro, duas saídas de
viaturas (estradas para o Cacuaco e Catete) e, uma de peões, onde era feito
controlo das saídas e entradas.
Fotos extraídas
de slides: do ex-furriel miliciano Manuel Pimenta
A da esquerda é o posto nº
1 e a direita é o início da rede, com entrada no mar
Baia
de Luanda nos anos 69/71
O alferes miliciano Breno de Vasconcelos, como a grande maioria dos militares não era portador de carta de condução: ambicionava tirar a carta naquele tempo de estadia em Luanda, não se tinha inscrito numa escola de condução, mas aproveitava todas as oportunidades, nos dias em que estava de ronda à rede (que era quase dia sim dia não). Certo dia em que o Breno estava de ronda, como sempre trocou com o condutor para treinar a condução. Nisto aparece na "picada" outra patrulha. Esta patrulha era formada por um condutor e o comandante do batalhão, tenente coronel António Soares. O comandante mandou parar a viatura onde seguia o nosso alferes e perguntou-lhe: "quem é o responsável da patrulha?", - responde o Breno ao volante do jipe: "sou eu meu comandante", - o comandante interroga-o de novo: "então o que está aí a fazer ao volante?",- diz o Breno: "estou a aprender a conduzir meu comandante", - o comandante, com cara de poucos amigos, argumenta e ordena: "está a aprender a conduzir, então não tem carta de condução, quando chegar ao Grafanil, passe pelo meu gabinete" - "sim meu comandante" remata o Breno.
Foto cedida pelo Simões: à esquerda o Alferes
Miliciano Vasconcelos e à direita
Furriel Miliciano Zé Simões
No gabinete do comandante continuou o interrogatório
ao alferes prevaricador. Em conclusão: o alferes miliciano Breno Botelho de
Vasconcelos, saiu do gabinete com uma pena de prisão e transferência para outra
companhia. A companhia de destino foi a CCaç 2569.
PS. O diálogo entre o alferes e o comandante, poderá
não ter sido exatamente como o descrito, mas resulta de muitas conversas com
outros camaradas. Seja como for, não deve ter andado longe do relato. As
consequências, essas foram as do
testemunho. FS
Já quase no final de comissão chegou ao nosso conhecimento
o seu falecimento, ocorrido a 26 de abril de 1971, num acidente (ver dados do falecimento do alferes).
Ver também: Cronologia da
Guerra Colonial - 1971 "Em Angola quatro militares da CCaç 2569 morrem
em acidente", entre eles estava o alferes miliciano Breno Botelho Vasconcelos.
A sua terra natal, Pilar Da Bretanha, no concelho de
Ponta Delgada, homenageou-o, atribuindo o seu nome a uma artéria da localidade
"Rua Breno Botelho de Vasconcelos".
Quanto ao tenente coronel, António Soares, depois de
terminada a comissão, regressou a Portugal, mas não por muito tempo, voltou a África para comandar um novo Batalhão. Nesta
comissão de serviço, foi saneado por "oficiais que não eram da linha dos que fizeram o 25 de abril ..." e apeado do comando.
Esta ocorrência relatada, nas suas próprias palavras, num encontro de graduados
e familiares do nosso batalhão. Extrato do vídeo do ex-furriel miliciano Manuel
Pimenta:
Faleceu a 2 de setembro de 2014, com 93 anos de idade.
Faleceu a 2 de setembro de 2014, com 93 anos de idade.
F. Santos - Memórias de Angola
4 de janeiro de 2018
Grande memória, Fernando Santos. Eu, como também fui condutor, sei bem dar o valor a este triste episódio de guerra, Foram centenas as aulas de condução que dei a outros camaradas, quase que abri uma escola de condução. Volto a dizer, muito bem descrito......só falta o cheiro a terra molhada e o som de uma batucada...ao longe.
ResponderEliminarTens razão Zé Nobre. Falta esse cheiro a África!
EliminarEstou muito concentrado nos factos, falta-me a poesia...Enfim é o que se pode...
Andei por lá, 73/75, Cengª9144.As memórias estão cá, as dificuldades e perigos vividos são passado, mas a experiência de vida foi enriquecedora, apesar de tudo.Luanda,o que eras e no que és.
ResponderEliminarSei como tudo se passa, tambem por la passei de 73 a 75, pretenci ao batalhão 4212/73-75. Estivemos em Luanda (Cacuaco)serca de um mês a tirar o IAO, e depois fomos para Cazombo leste de Angola.
ResponderEliminarAmigo tamb estive no Cazombo 73/75 era condutor auto no pelotão de canhões 4670/73 quem sabe se alguma vez nos cruzamos .
EliminarAbraço e boa semana
Eu também passei pela Maria Fernanda "Operação Kissonde" ficamos acampados junto á 1ªponte do Dange.De seguida fomos para a Lumbala Velha de reforço ao batalhão do Cazombo.C.Artª 1523 Cordões Negros
ResponderEliminarBoa memória, Fernando Joaquim. Abraço.
EliminarFiz o SMO em Luanda de 1971 a 1974.Pertenci ao Agrup. Transmissões e servi no CMsgs do ATmA e do QG.Essa missão durou mais de 2 anos. Passaram pelas minhas mãos centenas de mensagens de todos esses Batalhões e Companhias. Foram tempos, que dadas as circunstâncias, uniram muitos jovens que cumpriram honrada e dignamente a missão que lhes foi exigida. Cumprimento todos quantos nestas páginas deixam os seus testemunhos, enaltecendo também aquele magnífico território pelo qual se sacrificaram. Um abraço a todos. Jorge Pinho - ex furriel miliciano.
ResponderEliminarTambemn andamos nessas zonas e nessas datas eramos a C.CAC.4943 de Intervencao a tudo e a todos,enfim,{E Tudo o Vento Levou}..
ResponderEliminarA minha companhia, 1.CCAÇ do BCAÇ 4210- Lumeje( Leste) teve especial cuidado na formação dos condutores aquando do início da comissão,procedendo não só a prática intensiva mas sobretudo à sensibilização não só dos condutores como dos graduados que comandavam as colunas. Resultado ZERO mortos e feridospor acidentes auto. ( não deve ter havido muitos casos iguais)
ResponderEliminarA minha companhia a 1. CAÇ BCAÇ 4210 que esteve no Leste ,Luso e Lumeje em 73/74 teve especial cuidado na preparação e sensibilização dos condutores e graduados que comandavam as colunas, o que se traduziu no final da comissão em zero feridos e zero mortos por acidentes com viaturas. Na deve ter havido muitos casos similares nos 13 anos que andamos por África.., Abraço e saúde!
ResponderEliminarTambém eu tirei a carta em Bissau. Aprendi muito conduzindo um unimog da companhia. Obrigado condutor.
ResponderEliminarPertenci á CCAÇ2509/BCAÇ2873-Jun/69-Jul71.Zona de acção no Sub-Sector de Carmona,com sede no Quitexe.A minha Cªfoi sediada em Zalala e as restantes(Ccaç2508 em StªIsabel e 2507 em Aldeia Viçosa.Foi um periodo de muita actividade operacional,com excelentes resultados.Conheci bem a toda a região dos Dembos até Out/70 quando o Batalhão foi transferido para Catete.Além do patrulhamento de toda a área envolvente de Luanda participávamos como reforço em operações de maior envargadura efectuadas em outras zonas.Aproveito para cumprimentar todos aqueles que em Angola honrarem a Pátria.Um abraço a todos os ex-combatentes
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