Embarcámos em
Lisboa, no dia 8 de maio de 1969, a bordo do paquete Uíge, com destino à cidade de Luanda, Angola, onde chegámos a 21 desse mesmo mês.
Permanecemos no Grafanil cerca de 3 semanas, entretanto, participámos no
desfile do 10 de junho, que ocorreu naquela cidade.
Partimos quase
de imediato para os Dembos, passando pela Fazenda Maria Fernanda, onde ficámos
apenas alguns dias, antes de seguirmos para o nosso destino final, o Dange. Foi
nesta curta estadia, cuja duração, se bem me lembro, não terá ultrapassado os 8 dias, quando aconteceu um episódio que teve tanto de inesperado e absurdo, como
de trágico, o que dificulta traduzi-lo em palavras neste relato pessoal.
Fazenda Maria Fernanda |
No sexto dia de permanência na Fazenda, a 20 de junho de 1969, ao final da tarde, encontrávamo-nos junto ao espaço reservado à cozinha, quando tudo começou: estava uma ligeira brisa, o sol refletia-se na folhagem das bananeiras da encosta em frente, o vento fazia com que a folhagem das referidas bananeiras se movesse, provocando sombras difusas em movimento. Este cenário, levou-nos a imaginar e a acreditar de que aquelas sombras seriam o inimigo (vulgo “turras”) a passar de um lado para o outro, alinhando-se para um ataque surpresa. Iludidos pelo medo e pela inexperiência, fomos induzidos a organizar uma operação de reconhecimento e neutralização do “inimigo”.
Não sei bem
como foi tomada esta decisão, lembro-me que partiram duas colunas, - o
recrutamento terá sido feito na base do voluntariado -, uma seguia pelo lado
norte e outra pelo lado sul, sob o comando do Alferes Franco. Nós continuámos
junto da cozinha, - o jantar era, as inevitáveis salsichas com arroz -, onde o
cozinheiro Albertino (Ponte de Lima), mexia o arroz com uma enorme pá de
madeira. Ficaram por ali também o 1º Cabo cozinheiro Carlos Pereira e os
cozinheiros Orlando e Rodrigues, o Furriel Simões, penso que o Furriel Merca
também estaria, entre muitos outros camaradas, tanto das especialidades, como
atiradores, que se juntaram, observando com alguma ansiedade o que se passava
com os camaradas que participavam na já referida operação.
Os que ficaram,
iam fazendo alguns comentários, uns pró, outros contra, relativamente à
presença dos “turras”, mas parece-me que a tese do contra seria a mais
consistente e teria mais adeptos, no entanto, uma coisa é certa, havia uma
cisão nas opiniões que íamos tecendo. Estávamos nestas conjeturas quando se
ouviu um tiro, seguido dum tiroteio intenso, que demorou poucos minutos,
seguido de um silêncio opaco e assustador. Cerca de meia hora depois, quem
tinha ficado no acampamento, teve conhecimento da tragédia, que se saldava por
um morto confirmado, o Manuel Marques Ferreira e um ferido com certa gravidade, o
Albano de Jesus.
Há várias teses
sobre o que aconteceu no local, mas a mais provável, terá sido o desencadear de
um tiroteio na frente das duas colunas, uma contra a outra, por um disparo
inicial, inadvertido.
Hoje, à
distância de 45 anos, não se percebe muito bem, porque desencadeámos esta
insólita operação, quando no local, existia uma Companhia, que estava ali
instalada havia muito tempo e tinha como missão proteger a Fazenda. A nossa
Companhia estava apenas em trânsito para o Dange.
Fazenda Maria Fernanda: o nosso acampamento seria ao cimo desta rampa |
Fotos:
Pesquisadas na NET
F. Santos - Memórias de Angola
quarta-feira, 2 de dezembro de 2015
F. Santos - Memórias de Angola
quarta-feira, 2 de dezembro de 2015
PS. Alguém que tenha participado nesta operação deveria contar a sua versão dos acontecimentos, já que esta é uma visão parcial de quem permaneceu no acampamento e os presenciou de fora.
Me revejo muito nos teus depoimentos, uma Companhia do meu Batalhão esteve instalada na Fazenda Maria Fernanda, também por lá passei, pelos anos 63/65 era uma zona de grande actividade terrorista como lhe chamávamos, onde tomei parte em muitas operações
ResponderEliminarJ Costa; Pertenci a C.Cac 405 do Bat.442. Nos na Maria Fernanda, a 407 no Tari, a 406 nao muito longe e a CCS em Muxaluando, entre abril de 63 a outubro do mesmo ano. Conheci diversos camaradas e superiors, entre eles o Furriel Maia da CCS que tinha sido o meu instrutor na CIC 2, Figueira da Foz. Eu era portanto um condutor de GMC que lidava na picada muitas vezes so'. Deve lembrar-se do nosso primeiro desaire a um mes da chagada, em que eliminaram o n/ radio-telegrafista; e gracas a coragem e visao de um Furriel, conseguiram sair do local com ele e alguns feridos, um deles Furriel tambem que teve de regressar a Lisboa para ser tratado. Fomos no entanto (eu assim o considero), depois disso, poupados de maior desastres humanos. Eu mesmo fui visto (por uns poucos minutos), como sufocado pelo fumo da granada que rebentou quando saia da GMC. Estamos ca' e libres dessa contenda... Saude e mais uns anos de vida.
EliminarFui fuzileiro e também por lá andei Maria Fernanda, Maria Manuela, Fazenda Margarido, etc. lamentavelmente esses acontecimentos de confrontos entre as nossas tropas era frequente...
ResponderEliminarAo final da tarde de 6ªfeira 20Jun1969, encontrando-se desde há seis dias acantonada na Roça Maria Manuela, a CCac2505 sofreu a sua primeira baixa: no início da Op Grande Salto, coordenada pelo BCav2830, aquando na progressão por uma picada da Fazenda Maria Fernanda (subsector do Piri), o soldado atirador n/m 12164868 Manuel Marques Ferreira foi gravemente atingido por um tiro, tendo sido evacuado para a enfermaria da subunidade, onde veio a falecer.
ResponderEliminarEras da 2505?
EliminarNegativo.
ResponderEliminarFonte de informação: vd HU do 2872, em acervo no AHM sob a cota PT/AHM/2/2/94.
Saudações veteranas.
A " vd HU do 2872, em acervo no AHM sob a cota PT/AHM/2/2/94." não está correta: A C.Caç 2505 não estava nesta altura na Roça Maria Manuela, mas sim na Fazenda Maria Fernanda. Conhecemos a a Fazenda Maria Manuela, mas sempre de passagem. Depois da Maria Fernanda ficámos num acampamento junto ao rio Dange,a uns 4 Km da ponte, onde se encontravam os "Centauros", companhia de cavalaria que não recordo o número.Outra incorreção desse "acervo" é que a progressão não foi por uma picada, mas no interior da mata.
EliminarEu era radiotelegrafista da CCS do Batalhão de Cavalaria 2830 como tal também passei por essas fazendas mas foi na Maria Manuela que estive mais tempo para fazer proteção á engenharia militar na construção da ponte do rio Dange. A nossa base era no Grafanil porque era o Batalhão de intervenção e proteção á rede periférica de Luanda. Abraço a todos os camaradas.
ResponderEliminarJulgo ter dormido nesse local junto á fazenda Maria Fernanda em 68 P.Mort.1237 iamos a caminho da operação Nova Luz a abrir a picada até ao rio Dange. Um grande abraço a esses Combatentes.
ResponderEliminarTambém eu embarquei nesse dia e nesse navio.
ResponderEliminarFiquei em Luanda no AEA (Agrupamento de Engenharia de Angola) Enfermaria pois era ENFERMEIRO.