Antes de chegarmos ao Canage, um sítio onde não havia nada para além
do rio e a "picada, após o nosso Batalhão ter sido "despachado" para
a Região Militar Leste, durante o mês de
setembro de 1970, acampámos em Cangumbe, a partir daí, participámos na operação
"ESCOVAR", combatemos, patrulhámos, reconstruímos pontões, abrimos
picadas, recolhemos populações e reorganizámos o quimbo do Caminhão.
Placa
com as localidades e distâncias
Foto extraída dum slide do ex-furriel miliciano Marques Pimenta da C.Caç. 2504
Foto extraída dum slide do ex-furriel miliciano Marques Pimenta da C.Caç. 2504
Foi neste acampamento que o nosso camarada, António Joaquim
Piçarra, soldado atirador do 1º pelotão, com apetência e arte para as
tecnologias radiofónicas, construiu um posto emissor: um rádio velho, antena,
microfone, gira-discos que tinha sido utilizado no "Festival da Canção do Dange
1969" e discos, isto tudo colocado em cima dum caixote de material
militar. Assim nascia, o que viemos a chamar, "Radio Canage". O posto
emissor funcionava com uma cobertura reduzida, era no entanto, possível sintonizar na frequência que foi
escolhida, em todo o acampamento. Com o nosso locutor de serviço, Furriel
Miliciano João Merca, assistido pelo operador de som, soldado atirador António Joaquim
Piçarra, difundia música todas as tardes, do tipo "discos pedidos" e
simulava spots publicitários.
Foi com
suporte nesta rádio, que aconteceram estas
duas histórias (entre outras), do
testemunho que vamos relatar.
Vista
parcial do nosso acampamento - a "Rádio Canage"
funcionava numa tenda como a quadrada da foto
funcionava numa tenda como a quadrada da foto
As Histórias
"Relojoaria Canas Seguro"
Estúdio
da "Radio Canage", com o locutor
Furriel Miliciano Merca e o Furriel
Miliciano Seguro
O Furriel Miliciano Canas Seguro tinha residência em Luanda, onde morava com a esposa, aquando da nossa passagem pelo Grafanil. Após a transferência do Batalhão para a RM Leste, manteve a casa onde a esposa continuava a viver; deslocava-se algumas vezes a Luanda, utilizando, aquilo a que hoje chamamos "férias repartidas". Este nosso amigo tinha uma especial vocação para o negócio e quando regressava da capital, vinha munido dum carregamento de artigos para negociar: relógios de pulso, peças de ourivesaria e outros adereços; os seus clientes eram o pessoal da companhia, ou ainda, outros militares que por ali passavam, especialmente das outras companhias irmãs.
No intervalo duma dessas deslocações, foi montado e
inaugurado o "Rádio Canage". Quando do seu regresso, tivemos a ideia
de simular um anúncio. O nosso comerciante não tinha conhecimento da existência
do posto emissor, e, na tenda que servia de casa partilhada com outros
camaradas, havia companheiros que encarregar-se-iam de fazer com que ele
assistisse à difusão do anúncio. Quando nos assegurámos que tudo estava em
ordem, começou a encenação: na telefonia ouvia-se música; termina a passagem
dum disco; neste momento, ouve-se o locutor - "agora é o momento da
publicidade", "não tem relógio ou o seu está avariado?", temos a
solução! No Canage, dirija-se à 'Relojoaria Canas Seguro', relógios bons e baratos, só em 'Canas Seguro'!", isto acompanhado com música de fundo. O Seguro
que estava sentado, dá um salto, fica incrédulo e com ar de espanto, ainda sem
acreditar no que estava a ouvir, interroga-nos: "Eh pá! Vocês puseram este
anúncio na rádio?!"
O Furriel que se passou para o lado
dos "turras"!
O soldado atirador do 3º pelotão, Carlos Andrade
(mais conhecido por "Martelão"), chegava duma coluna de proteção ou duma
operação, não nos recordamos qual a missão, ao chegar à tenda que dividia com
outros militares, sentou-se na cama a descansar. Naquele momento, ouvia-se
música dos anos 60, na rádio. Termina uma canção que estava a passar, entra no
ar o locutor: "agora música da nossa terra, vamos ouvir, 'Muxima' do Duo
Ouro Negro". O Carlos Andrade que não estava a par da existência da nossa
rádio, exclama, entre a admiração e a interrogação: "mas isto é o furriel Merca a falar!?"
- "Ah então tu não sabes?" questiona outro camarada, - "não sei
o quê?", pergunta o Andrade - "O furriel Merca desertou e passou-se
para o lado dos 'turras'!" disse outro militar, - "Ah! Eu sempre
achei que ele não era bom!", disse o 'Martelão' e remata, "tamém já
não come do porco!" (o porco era um animal que tinha sido encontrado e
trazido para o acampamento e estava destinado a um assado no forno).
F. Santos - Memórias de Angola
5 de janeiro de 2018
Achei graça ao que acabo de ler e curiosamente, recordo a minha passagem, por Cangumbe e a minha ida ao “sobado do Caminhão” com dois alferes, estacionados em Cangumbe, um, mais tarde, trabalhou como advogado, no porto de Leixões, já não recordo o nome e o outro era o Alf. Leão, creio que ambos da região do Porto...curiosidades.
ResponderEliminarOK.FUI CONDUTOR NA CART.2481 CONHECIDO POR Tony.e o Alferes que esteve como advogado em Leixões chamasse Sebastião Simôes Marques. O Outro Alferes era o Alferes Leão já Falecido em 2011 infelizmente.Que Deus o trnha em eterno descanso
ResponderEliminarHistórias que nos faziam rir e ajudavam a passar o tempo
ResponderEliminarConheci bem desde o Lucusso a Teixeira de Sousa!
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