(As minhas traquinices e tropelias
não ajudavam nada ...)
Sempre morei com a minha avó materna (viúva),
inicialmente, em Torre e Cercas, na casa que lhe pertencia por herança. Conjuntamente com a casa também era
proprietária de terras com alfarrobeiras, amendoeiras, figueiras e oliveiras.
Nessas terras cultivávamos todas as sementeiras de sequeiro, trigo, favas
"griséus", cevada e aveia. Mais tarde quando nos mudamos para o Monte
Branco, fomos residir para a casa dos meus pais, ela acompanhou-nos sempre, até
ao dia da sua partida para a última morada.
A minha ligação com a minha avó foi sempre grande,
desde do meu nascimento era uma presença constante no meu quotidiano, ia com
ela para todo lado: lavar na ribeira; carregar água; na visita aos parentes,
espalhados por toda a charneca desde a Franqueira, passando pelo Vale da Vila
até aos Queimados. Nesta área não havia nenhum conjunto de casas onde não
tivesse um primo, um sobrinho ou um
parente um pouco mais afastado.
Em Torre e Cercas, na zona onde residíamos, só a chuva
trazia alguma quantidade de água, proveniente das goteiras dos telhados. Para
obtê-la no espaço de tempo em que não
chovia, tínhamos de providenciar o carregamento deste tão precioso líquido. Era
na fonte da Fonte Figueira e em algumas noras que existiam ao longo ribeira que
obtínhamos a água necessária para a lida da casa, com o transporte a fazer-se pelo processo mais
comum, o burro, cangalhas e cântaros. Eu apanhava sempre boleia neste
transporte.
Um nora na ribeira (abandonada)
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Mas noutros dias em que não íamos à água com o burro,
havia no lado nascente na direção da Franqueira, ao cimo da encosta um poço, onde
a minha avó ia providenciar o carregamento de água. É aqui que começava sempre
a odisseia desta memória: o caminho até ao poço não causava grandes problemas,
com os baldes vazios e eu (teria nessa
altura 4 ou 5 anos) sob controlo; no regresso a minha avó transportava dois
baldes cheios de água com uns 7 litros cada um; o caminho era íngreme, com
veredas irregulares, curvas, pedras e algumas moitas por todo o lado; ela era
obrigada a descansar algumas vezes durante o percurso por aquela encosta
abaixo; mas o
maior problema era eu que não me
sujeitava a ir junto dela, escondia-me nas moitas (carrascos e tojos e outros arbustes), saltava,
caía e levantava-me e sacudia as mãos da terra; ela com toda esta preocupação comigo, com tantos ralhetes pelo
caminho, balouçava os baldes; ia entornando a água pela saia, meias e sapatos;
chegava a casa toda molhada e com metade da água com que iniciara a viagem.
Quando recordo a minha infância, mais do que os meus
pais, a minha avó materna é minha referência, como figura sempre presente na
minha vida. Tenho muitas saudades dela!
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F. Santos - Memórias de infância
3 de julho de 2018
Com amor.....com muito amor. Eu, não conheci nenhumas das minhas avós, mas conheci as minhas duas bisavós. Muito bem narrado e com sentimento. Abraço.
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