(A jiboia… a bússola… e a G3, ou a
vida atribulada no Dange…)
Casa nova, vida
nova, é o que se costuma dizer quando mudamos de casa ou de emprego…, neste
caso nem mudámos de casa nem de emprego, deixamos apenas umas funções e fomos
investidos noutras.
As novas
funções não nos traziam tantas preocupações como as anteriores, pois,
limitavam-se aos serviços da companhia, operações no interior da mata (3 a 5
dias) e colunas motorizadas para proteção de viaturas civis, entre as Fazendas
Maria Fernanda e Maria Manuela, a partir do nosso acampamento na foz do rio
Loge, que desaguava no Dange. Mas não estávamos de todo sensibilizados para
estas tarefas, mas lá íamos cumprindo sem dificuldade de maior.
No desempenho
dessa função de “operacional”, aconteceram vários episódios, dos quais
escolhemos três, que na nossa opinião, têm algum interesse, para que não se
perdessem e perdurassem na nossa memória coletiva:
A jiboia
!º cabo Joaquim Santos |
Ponte Totobola |
De
regresso duma missão à Fazenda Maria Manuela, já era início de noite,
não nos recordamos qual a missão, mas também não é importante para o episódio
que vamos narrar. Quando nos aproximávamos do aquartelamento da companhia de
cavalaria, “Os Centauros”, que fazia a proteção à construção da ponte
sobre o Dange (Ponte Totobola), chama-se assim, não sei porquê, talvez por ser
a ponte da sorte, sorte! não faço ideia de quê! Mas vamos continuar; aí
chegados, a uma distância que não sei precisar com exatidão, todavia não devia
ser longe do aquartelamento da referida companhia, deparámo-nos com uma jiboia
enorme que ocupava toda a largura da estrada, como não queríamos passar sobre o
bicho, não porque o pudesse magoar, mas não queríamos, parámos as viaturas, apeámo-nos,
discutimos o que fazer, e, saiu um decisão brilhante, matar a jiboia a tiro,
não sei quem disparou, nem isso interessa muito, penso que o bicho morreu, mas
ao ouvirem todo aquele tiroteio, os nossos amigos “Os Centauros”,
pensaram de imediato que estavam a ser atacados pelos “turras” (nome
vulgar porque eram conhecidos os guerrilheiros). Organizaram-se imediatamente,
e, em coluna apeada, dirigiram-se para o local de onde vinha o som das rajadas,
na sua deslocação, demorou pouco tempo, vislumbrarem as luzes das nossas
viaturas, verificaram então, que não se tratava de nenhum ataque, era apenas
mais uma “maçaricada” dos vizinhos do Dange. Tivemos sorte, porque “Os
Centauros” já eram “velhinhos”.
A bússola
Estava tudo no
seu lugar, era mais uma manhã tranquila no nosso aquartelamento, havia no
entanto, qualquer coisa de diferente, tínhamos em nosso poder um guia que tinha
sido guerrilheiro naquela região. Claro que se antevia uma operação guiada, com
um objetivo muito concreto, assaltar um acampamento inimigo, só não sabíamos
quando. Pois aconteceu que veio a ordem para a operação ter início nessa manhã;
o sol já ia alto, não tivemos direito a almoço quente, e, preparámos tudo;
rações de combate, cantis com água, oleado e a inseparável G3; os dois pelotões
que tinham sido escalonados, onde nos incluíamos, partiram com as mochilas às
costas.
Pernoitamos
numa encosta, o mais perto possível do objetivo, essa noite foi horrível, o
frio era imenso, e não tínhamos agasalhos para essa eventualidade, juntamo-nos
em grupos, delimitamos uma área em círculo, cada um desses grupos formava um
posto de vigilância, com um vigia, que era rendido ao longo da noite, cada
camarada fazia um turno de vigilância. O frio era tanto que nos tapámos com os
oleados, que não foram suficientes para nos aquecer. Ao levantarmos de manhã,
tínhamos cavado uma vala aos pés, de tanto nos mexermos.
No último dia
já cansados de andar às voltas, o alferes que comandava a operação, já
irritado, voltou-se para o guia, e perguntou-lhe: “Então você não sabe onde
é o acampamento?”; o guia a tremer, apavorado, todo ele transparecia medo,
respondeu com a voz trémula: “meu alferes veja aí na máquina” (máquina
era a bússola que o alferes empunhava naquele momento, mas que não
ajudava muito…). Continuamos a nossa caminhada, mas a única coisa que
encontramos foi um acampamento abandonado há muito tempo.
A G3
Periodicamente,
dado que não conseguíamos gastar as munições nas operações, e convinha testar o
armamento, fazíamos treino de tiro.
Naquela tarde o
alvo era a encosta em frente ao nosso aquartelamento, virada a nordeste do
outro lado do Dange. Foram testadas todas as armas, bazuca, breda, morteiro
etc…, foi também efetuado tiro de G3, de repetição e rajada, o tiroteio foi
tanto que derrubámos as árvores mais altas da encosta. Derrubámos! Nem todos,
pois o vosso amigo “operacional” nem um tiro conseguiu dar de tanta
sujidade acumulada na G3 que tinha distribuída à sua responsabilidade.
Conclusão andou
todo esse tempo, em operações e colunas, com uma arma às costas que só serviu
para fazer peso, dificultar a caminhada e talvez assustar o inimigo.
terça-feira, 14 de maio de 2013
A ponte chamava-se Totobola por causa do Coronel Totobola(Coronel Alves Pereira) que a mandou construir.
ResponderEliminarConheci o tenete-coronel totobola. em Quibaxe tirou-me o numero para me fazer uma participação, mas deu em nada quando soube que éramos tropa de santa Eulália. 1966
EliminarA alcunha De tobola do tenente coronel é porque a onde chegava dava sempre 3 tiros para o ar e dizia frase 1X2 . Isso era o que constava por toda a zona do Dange. Quanto á giboia na altura estava na fazenda Maria Manuela precisamente a dar proteção a engenharia eu era da CCS dos Centauros e tenho uma vaga ideia desse episódio.
ResponderEliminarTambém estive na Fazenda Maria Fernanda, pertencia à C.Eng.2535.Chegámos a esta Fazenda ao anoitecer.Quando chegámos soubemos que a Companhia sediada no local tinha acabado de sofrer uma "baixa". Tristeza enorme, contaram-nos que o "camarada" em questão pertencia a uma Companhia que tinha saído de Abrantes, fizeram a viagem juntamente com a C.Eng. 2535 e tal como nós éramos "maçaricos". Que a sua morte se deveu a um equivoco, foi o que se ouvi dizer.
ResponderEliminarCamarada, tens aqui a narrativa dessa baixa a que te referes. Copia o link, acede e acede ao testemunho: http://memoriasdeangolafernandosantos.blogspot.com/2018/01/maria-fernanda-uma-dolorosa-recordacao.html
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